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Produção de conteúdo: agradando o paladar do consumidor digital

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Por Júlia Fontanive – Redatora Júnior da Agência Moove

Publicado em 22/09/2020

 

Durante muito tempo — aquele em que imperou a mídia offline —, fazer uma boa peça ou campanha publicitária foi que nem fazer um bolo: seguindo uma receita clara e envolvendo satisfatória ~cobertura, o público seria impactado, consumiria o produto e logo seguiria com sua vida. Nada trocar receitas ou dividir com os amigos. Em torno dessa ideia giraram muitas das teses sobre comunicação integrada¹, que reforçam a importância de segmentar bem o público-alvo e desenvolver um storytelling envolvente para despertar no consumidor identificação e desejo, levando-o a adquirir o produto ou serviço e finalizando, assim, o processo da comunicação.

Acontece que, com o surgimento da internet e das redes sociais, o universo publicitário foi revolucionado: não só os consumidores de bolo ganharam mais espaços e se tornaram ferrenhos críticos gastronômicos, como também passaram a receber ofertas de todo o tipo de sobremesa a todo momento. Agora, empanturrados e percebendo o seu recém-adquirido poder, são agentes ativos e extremamente importantes (se não os principais) na produção de uma boa campanha.

É um chef de pâtisserie há anos ou tá recém começando a botar a mão na massa do mercado publicitário? Seja como for, convido a repensarmos juntos algumas receitas e a explorarmos novas formas de interagir com esse tão mudado consumidor:

Não adianta tentar enformar bolo de caneca

Há quem diga que o material publicitário está cada vez menos saboroso: perdeu-se aquela ideia de grandes campanhas que marcam gerações e ficam no imaginário do consumidor por anos, como as 1001 Utilidades do Bombril, os fofos Mamíferos da Parmalat e o hipnotizante Compre Batom. Agora a vida útil das peças digitais sozinhas é quase nula, sendo esquecidas em com um rolar da timeline. Mas muito disso se deve ao erro frequente de diversos anunciantes: querer encaixar receitas de 20, 30 ou 40 anos atrás em formatos do agora.

O melhor a fazer, nessa nova realidade, é compreender que os meios mudaram e, com eles, a experiência do usuário também. Cada vez mais, é necessário pensar não só no conceito criativo da campanha, mas sim na relação que o usuário terá com cada peça que a envolve. Na internet, são melhor recebidos os conteúdos e ingredientes que já consideram e se utilizam dos formatos em que eles devem ser apresentados, como acontece na campanha Tagwords, lançada pela Budweiser em 2018.

Quem sabe assim não voltamos a surpreender o consumidor com sabores inovadores?

Antes uma garfada, depois — talvez! — a história de vida do confeiteiro

Usuários de redes sociais recebem, a todo momento, ofertas dos mais diversos tipos de sobremesa, com uma verdadeira sobrecarga de informações e estímulos. Tudo é muito expresso, e ninguém tem tempo a perder: as coisas precisam ser imediatas.

Essa verdade coloca em xeque as premissas de um bom storytelling — que dizem que para envolver propriamente o consumidor é preciso apresentar sempre uma ordem clara de início, meio, clímax e fim. Nas redes, precisa-se fazer o caminho inverso: enfiar goela abaixo do público em segundos uma garfada apetitosa (o clímax), convencendo-o a ficar por aí para o final. Com preços de veiculação muito mais acessíveis, o ambiente digital vem com a possibilidade de segmentar uma campanha em quantas peças forem necessárias, mas traz sempre o desafio de que cada uma delas seja imediatamente atrativa, para assim garantir o engajamento do público — tanto no cenário micro (o conteúdo da peça) quanto no macro (a campanha inteira). Somente depois do primeiro impacto e caso estiver genuinamente com vontade de mais garfadas, nosso consumidor irá, por conta própria, atrás de conhecer o ínicio e o meio que a marca tem para oferecer (entrando na página, por exemplo, e buscando saber mais). 

Em paralelo a isso, outra novidade para a hora de se pensar um storytelling: imprevisíveis nesse novo mundo cheio de possibilidades, nem sempre os usuários sentem a necessidade de contextualizações sérias e pertinentes para se engajar com conteúdos. Muitas vezes, basta aquela única garfada surpresa para que eles se sintam satisfeitos e dispostos a curtir e compartilhar a sobremesa com sua rede de amigos — não precisando nem mesmo, inclusive, perceber que o que acabaram de comer era bolo! Prova dessa imprevisibilidade dos internautas é que eles têm se mostrado dispostos a viralizar conteúdos extremamente banais e nada elaborados. É o caso dos memes e de campanhas publicitárias como a do World Record Egg. 

Sem que haja uma receita pronta para determinar o que viraliza ou não, produtores de conteúdo — tanto os profissionais quanto as marcas para que trabalham — precisam se contentar com os dados que indicam ingredientes similares já bem recebidos pelo público e, acima de tudo, não temer na hora de levar novas combinações ao forno. 

Ninguém come um bolo sozinho

Aqui se chega, talvez, no ponto mais importante da mudança no papel do consumidor: agora, com a mídia online, ele ampliou absurdamente seu potencial de levar pedaços do nosso bolo para outras pessoas, criando com facilidade campanhas orgânicas de convergência midiática (veiculadas tanto nas mais variadas redes sociais, quanto por veículos jornalísticos que aderem à sua pauta o que está em alta). Para tê-lo ao nosso lado, basta que ele goste do sabor do que oferecemos!

Assim, cabe a quem pensa diariamente a publicidade atentar tanto ao que pode captar a atenção dos empanturrados quanto à diferença entre fazer um uso pertinente do potencial de convergência midiática, planejando diferentes peças para diferentes espaços (virtuais ou não), e em simplesmente floodar as plataformas do usuário com conteúdos repetidos e sem sentido, obrigando-o a comer pedaços de bolo que só fazem estufar. 

Fica a certeza de que, cada vez mais, a propaganda precisará se desdobrar — figurada ou literalmente — para ofertar aos usuários, nos diversos canais em que eles estão ativos, sabores pelos quais se interessam — mesmo que ainda não se saiba ao certo quais são.

¹Como por exemplo as dos autores Terence A. Shimp, James Odgen e Edson Crescitelli; nas obras Comunicação Integrada de Marketing: propaganda e promoção, de 2009 e Comunicação integrada de marketing: conceitos, técnicas e práticas, de 2007.